A cada novo verão ou inverno, quando os eventos climáticos são mais intensos, sentimos como sociedade as consequências das mudanças climáticas em nossas vidas. A cidade de Curitiba carrega em seu DNA urbanístico as características que a tornam uma das cidades mais admiradas do país, em termos de planejamento, qualidade de vida e inovação. Foi a conexão destes diferentes fatores que levou um dos mais renomados climatologistas do país a ser o convidado do evento que aconteceu no auditório da FESP na tarde da última quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023 – o evento contou com o apoio da Nutrimental. Para falar sobre “As Mudanças Climáticas e o Papel de Curitiba como um Laboratório de Soluções”, Paulo Nobre reuniu alunos, professores, empresários e comunidade em uma atividade cujo objetivo está ancorado nos próximos dez anos: tornar a capital paranaense uma das cidades mais climaticamente inteligentes do mundo.

A curto prazo, o objetivo não se resumiu em apenas entender o diagnóstico e o desafio trazido pelo professor Paulo Nobre, mas também ouvir e colher as ideias e sugestões dos participantes que, após a palestra do especialista, reuniram-se em pequenos grupos para debater o tema e terem suas vozes ouvidas pelos facilitadores. O objetivo a curto prazo é reunir proposições a serem apresentadas na conferência Smart City Expo Curitiba, que acontece entre os dias 22 e 24 de março no Centro de Evento do Parque Barigui.


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Palestra

“Temos um desafio à nossa frente, um desafio sério o suficiente: o destino de muitas pessoas que você gosta e que você conhece está em nossas mãos” – assim começou a fala do professor Paulo Nobre, pesquisador do clima do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE. Ainda segundo o professor, o problema não se atém à quantidade de carbono acumulado na atmosfera, mas ao devir de uma ética que reformule o pacto que envolve produção, serviços, consumo e civilidade.

Paulo Nobre esteve em Curitiba durante a mais recente edição da Oficina de Música e viu aqui uma possibilidade de aproveitar o potencial urbanístico da cidade para desenvolver soluções exemplares no que diz respeito aos desafios impostos pelas mudanças climáticas. “O que me chamou a atenção em Curitiba é que eu vi várias assinaturas de uma cidade construída para as pessoas, pelas pessoas”. Essa “hereditariedade”, nas palavras do professor, foi “o que me chamou a atenção em Curitiba, que vocês já tinham uma história, um caminho traçado. Já é a história de vocês. Se nós aplicarmos o conhecimento, recursos e a participação das pessoas na elaboração das soluções que lhes são pertinentes, nós vamos ganhar a coisa mais fabulosa, que é a continuidade entre gestões e governos”.

O raciocínio é que foi justamente o pertencimento dos Curitibanos ao projeto desenvolvido do que foi chamado de “Cidade Modelo” é que nos traz à Curitiba de hoje: uma cidade com os defeitos de todas as outras, mas com algumas características que a diferencia das demais. Todo curitibano tem participação ativa em soluções urbanísticas que deram fama à capital paranaense, como o calçadão da Rua XV de Novembro exclusivo para pedestres, a reciclagem do lixo, soluções inovadoras para o transporte público, o plantio de árvores e os parques desenvolvidos para conter as enchentes – por exemplo.

Segundo Paulo Nobre, não há mais tempo nem espaço para o negacionismo. “O negacionismo é uma ação que nos incapacita a resistir às alterações do clima. Os donos do grande capital, das grandes empresas, já entenderam que o dinheiro não tem valor nenhum num clima absolutamente de ponta-cabeça”. Para Paulo Nobre, a chave é o conhecimento, o desejo pelo conhecimento e a participação de toda a sociedade, o que inclui as crianças. “Essa é a minha proposta: vamos aprender brincando. Vai ser muito bacana. Depois não vamos queremos voltar no tempo: ‘Aquela sociedade obscurantista, ignorantes dos processos? Eu não quero viver. Quero viver nessa sociedade onde as pessoas têm o prazer de viver’, conclui.

Continuidade

O evento sobre Curitiba e as Mudanças Climáticas promovido com o professor Paulo Nobre na FESP faz parte de um esforço que envolve a academia, empresários, poder público e a sociedade civil na mobilização para o diálogo e a construção coletiva de soluções para as demandas climáticas. Um dos fomentadores deste debate é o empresário curitibano Rodrigo Rocha Loures, que esteve presente no evento. “Este ano vamos ter contribuições de diversas cidades. Isso é um programa de uma rede brasileira de competências de cidades climaticamente inteligentes, onde Curitiba vai ser a locomotiva desse processo”.

Além da pauta propositiva a ser apresentada no mês de março na Smart City Expo Curitiba, a intenção dos realizadores do evento é promover uma conferência internacional sobre as mudanças climáticas em 2024, em Curitiba. “A grande motivação é que a mudança climática é o vetor central de um novo ciclo de uma nova economia. Daqui por diante, aquilo que se convencionou chamar de a nova industrialização do Brasil, assim como os novos paradigmas de serviço e políticas econômicas e ambientais, vão ser muito pautadas pelas mudanças climáticas e pela economia digital. Essa é a nova fronteira do conhecimento para ter um mundo sustentável, um mundo em que exista um maior equilíbrio entre as atividades humanas e a biosfera”, pontua Loures.

Metodologia

O evento contou com a mediação de Wilson Nobre, professor da Fundação Getúlio Vargas (Brasília) na área de inovação. Para viabilizar a participação efetiva do público presente, Wilson escolheu a dinâmica “World Cafe”, no qual as pessoas se reúnem em pequenos grupos para a geração de impressões e ideias que dão continuidade ao evento. Sobre a atividade em grupo, Wilson explicou que “no exercício que aconteceu após a palestra do Paulo, cada grupo reuniu cinco ou seis pessoas, cada um falou. O que é diferente do auditório, onde todo mundo ouve a voz do especialista e ninguém sai com tarefa”.

Já de volta ao auditório, cada participante sugeriu algumas palavras como síntese, que foram dispostas no formato nuvem para  uma percepção coletiva sobre o tema. Como continuidade, cada um dos presentes ficou incumbido de enviar seu relato por email. “O meu modo de entender é devolver às pessoas o convite para elas serem atores ativos e não apenas receptores da solução. Quer dizer, são as pessoas que farão a solução e não as pessoas que receberão a solução das instituições”, opinião de Wilson Nobre, compartilhada também por seu irmão Paulo.